segunda-feira, 5 set 2016
Se você
está na faculdade aprendendo macroeconomia, você provavelmente está utilizando
o livro Introdução
à Economia, de Gregory Mankiw, um best-seller que já está em sua sétima
edição. O professor Mankiw é o
presidente do Departamento de Economia da Universidade de Harvard e o foi
conselheiro econômico de George W. Bush.
Em si, o
livro é um grande avanço em relação aos best-sellers anteriores, como, por
exemplo, o
livro-texto de Paul Samuelson, que foi o mais influente livro-texto de
economia do mundo pós-guerra, com pelo menos 3 milhões de cópias vendidas
em 31 idiomas distintos. Na edição de 1989 de seu livro-texto, Samuelson
escreveu: "A economia soviética é a prova cabal de que, contrariamente àquilo
em que muitos céticos haviam prematuramente acreditado, uma economia
planificada socialista pode não apenas funcionar, como também prosperar". Dois anos depois, a URSS acabou.
Mankiw
fornece uma sólida apresentação de tópicos técnicos com o intuito de preparar
os alunos para estudos futuros. No
entanto, o livro é fraco em uma área em que deveria ser extremamente robusto: os
princípios fundamentais que constituem a própria essência do raciocínio econômico.
A
omissão destes seis conceitos essenciais é um grande desserviço aos estudantes
que queiram realmente adquirir um sólido raciocínio econômico e aprender a como
tomar decisões econômicas sensatas.
1. Somente indivíduos escolhem, e somente
indivíduos agem
O
professor Mankiw apresenta a economia como sendo "o estudo de como a sociedade
gerencia seus recursos escassos".
Essa
definição trata a economia como a ciência que planeja soluções coletivistas
para os problemas de alocação de recursos técnicos. Ao dar essa definição, Mankiw deixa de fora
tudo aquilo que torna o estudo da economia tão rico.
A
economia é fundamentalmente o estudo do comportamento humano sempre que há uma
escolha envolvida. Somente indivíduos
tomam decisões, e somente indivíduos agem de acordo com essas decisões.
Em
termos práticos, a ciência econômica não
é simplesmente o estudo de fenômenos econômicos visíveis, como preços,
produção, juros e dinheiro. A ciência
econômica é o estudo de como esses fenômenos são gerados pela interação entre,
de um lado, as idéias e as ações dos indivíduos e, de outro, um ambiente que
oferece recursos limitados para a satisfação das necessidades humanas.
Ao
ignorar o princípio de que a economia se baseia na escolha individual, o texto
de Mankiw perde a oportunidade de fazer com que o estudo da economia seja
pessoalmente relevante para os estudantes.
Poucos estudantes irão criar outra curva de demanda, mas todos se
beneficiam se souberem raciocinar de uma maneira que propicie melhores decisões
nos empreendimentos e na vida.
A
economia é especialmente valiosa quando ensinada como sendo um conjunto de
ferramentas que propicia um melhor entendimento das escolhas que pessoas de
verdade têm de fazer e das decisões que elas têm de tomar.
2. O valor econômico é subjetivo
O que é
mais valioso: ingressos para uma partida de futebol ou um livro-texto de
macroeconomia? Uma estudante dedicada de
uma universidade pode estar pouco interessada em futebol, preferindo gastar seu
dinheiro em um livro-texto, de modo que ela possa ser aprovada na matéria. Já eu preferiria gastar dinheiro em um
ingresso para a final de uma partida de futebol, nem que seja para ter uma
experiência fora da rotina.
Os
recursos econômicos que valoramos só se tornam valiosos para nós quando
comparados às alternativas disponíveis; quando são vistos dentro do nosso plano
de satisfazer algum objetivo em relação às alternativas disponíveis.
Valorar
algum bem ou serviço significa escolher entre esse bem ou serviço e bens e
serviços alternativos. Quando fazemos as escolhas, isto é, quando agimos,
o fazemos acreditando que aquela escolha, ou aquela ação, irá nos
proporcionar satisfação maior do que a satisfação que os outros bens e serviços
proporcionariam.
Em suma,
o valor está nos olhos de quem percebe.
Ou, em
outras palavras, o valor
econômico é subjetivo.
Infelizmente,
o texto de Mankiw não fornece qualquer explicação sobre o valor econômico. Em vez disso, ele dá um salto e imediatamente
começa a tratar a economia como um problema de alocação de recursos a ser
solucionado por economistas espertos.
Mankiw
tem o cuidado de explicar que os economistas podem discordar entre si sobre
como os recursos deveriam ser distribuídos, mas ele ignora inteiramente a noção
de que recursos só têm valor para um indivíduo de acordo com seus planos,
idéias e objetivos, os quais ocorrem em um momento específico do tempo e em
meio a circunstâncias que estão em constante mudança.
É
possível entender por que os estudantes acreditam que a economia é realmente a
"ciência sombria":
os livros-texto omitem a maior parte dos componentes humanos da economia.
3. O problema do conhecimento
Nenhuma
pessoa ou grupo de pessoas possui o conhecimento suficiente para fabricar sozinho um lápis. Muito menos para planejar as ações de milhões
de pessoas. Cada indivíduo possui
valorações exclusivas e subjetivas em relação aos recursos disponíveis, em um
mundo que está em contínua mudança.
O
conhecimento sobre os recursos que estão sendo mais urgentemente demandados
para satisfazer as necessidades das pessoas estão fragmentados e dispersos por toda
a economia. É impossível uma mente ou mesmo várias mentes obterem e processarem
todas essas informações
que estão dispersas na economia. O conhecimento dos dados surge
continuamente em decorrência da interação livre e espontânea de bilhões de
indivíduos. Essas interações, que
ocorrem diariamente, produzem uma multiplicidade de informações que são
impossíveis de serem apreendidas e processadas por apenas um seleto grupo de
seres humanos. E essas informações estão
constantemente mudando de acordo com as alterações nas circunstâncias.
É
impossível planejar centralizadamente tudo isso. Foi F.A. Hayek quem melhor enfatizou e
explicou o quão literalmente impossível é para uma autoridade central coletar,
agregar e utilizar esse tipo de conhecimento circunstancial de modo a
efetivamente planejar uma sociedade.
Por
isso, uma das primeiras lições para um estudante das ciências sociais deveria
ser a de aprender a diferenciar o conhecimento real daquilo que Hayek chamou de
uma mera pretensão do
conhecimento.
A
genuína humildade em reconhecer os limites da razão humana permite uma constatação verdadeiramente
bela.
Lamentavelmente,
essa constatação não aparece nem sequer uma vez nos livros-texto de economia
das universidades. Muito menos no de Mankiw.
4. Aquilo que se vê e aquilo que não se vê
As
pessoas são rápidas em analisar resultados e consequências facilmente
perceptíveis. Quando o governo fornece
subsídios a determinadas empresas e estas criam empregos, vemos pessoas
empregadas, trabalhando e recebendo um salário.
Sim, as
empresas que receberam dinheiro subsidiado do governo (impostos) se deram muito
bem. Seus parceiros e empregados
também. Seus fornecedores
igualmente. Só que isso é apenas aquilo
que se vê.
E aquilo
que não se vê? São poucos os que
conseguem perceber os efeitos não-visíveis dessa política.
Vemos o
dinheiro de impostos beneficiando essas empresas, mas não vemos os
investimentos que deixaram de ser feitos, bem como os bens e serviços que não
foram produzidos e, consequentemente, não foram consumidos. As demais pessoas e empresas tiveram de
bancar o governo — tanto via impostos quanto via empréstimos — para que o
governo subsidiasse a bonança dessas empresas privilegiadas. Consequentemente, as empresas investiram
menos, produziram menos e empregaram menos.
E as pessoas consumiram menos.
O mesmo
raciocínio se aplica a aumentos ao funcionalismo público e à criação de mais
empregos na burocracia estatal.
À medida
que recursos escassos são desviados para programas de estímulo patrocinados
pelo governo ou para o financiamento da burocracia estatal, empregos
alternativos e criadores de riqueza são abortados e jamais são criados.
Políticas
estatais não apenas produzem impactos imediatos, diretos e positivos para
alguns grupos facilmente identificáveis, como também gera efeitos nocivos e de
longo prazo sobre grupos menos visíveis, mas que são maioria.
O
economista francês Frédéric Bastiat ensinou uma das mais simples, porém mais
profundas lições de toda a ciência econômica: os economistas bons são aqueles
que sabem analisar tanto aquilo
que se vê quanto aquilo que não se vê.
Você
pode até achar que isso soa um tanto óbvio, mas a persistência de argumentos
populares, que vão desde aumentos
do salário mínimo a empréstimos
subsidiados pelo governo, passando por todos os tipos de políticas assistencialistas
e de aumento dos gastos do estado, mostram que tal lição está longe de ter
sido compreendida.
Henry
Hazlitt percebeu que essa constatação de Bastiat era tão importante para combater falácias
econômicas populares, que ele a transformou no tema central do seu livro Economia Numa Única Lição.
Infelizmente,
essa lição continua oculta nos livros-texto de economia.
5. Empreendedorismo
Jamais mencionadas
uma única vez nas 880 páginas do livro-texto de Mankiw sobre princípios de
economia são as palavras "empreendedorismo" e "empreendedor".
A criação
de valor econômico é um processo, e o empreendedor possui uma função-chave
nesse processo. Empreendedores criam
riqueza ao alocar corretamente recursos escassos para setores em que a demanda
do consumidor é maior. Empreendedores criam
riqueza ao alocar recursos escassos para usos mais produtivos. Eles fazem isso ao criar novos produtos, ao
inovar processos que irão substituir os antigos e ao descobrir oportunidades
ainda não percebidas de lucro, agindo então em cima dessas oportunidades.
Empreendedorismo
é perceber oportunidades que não estão especificadas nos dados. É o ato de ver uma nova maneira de alocar
meios para alcançar um fim. Empreendedorismo
não é apenas tentar melhorar algo que já existe. O mundo real é dinâmico e está em contínuas mudanças.
Lamentavelmente,
parece não ter sobrado espaço para explicar o papel da criação de valor feita
pelo empreendedorismo em um livro-texto que trata a riqueza que já existe como
um fato consumado, e que diz que o problema da alocação e da
distribuição da riqueza já existente são as principais preocupações de um
economista.
6. Governos não são formados por anjos
Seções inteiras
do livro-texto de Mankiw são dedicadas a explicar as "falhas de mercado". E ele é rápido em oferecer explicações que
mostram como os governos podem teoricamente melhorar os resultados do mercado.
Segundo Mankiw,
"a tensão entre êxitos do mercado e falhas do mercado é um
ponto central na microeconomia". E completa:
"o problema da informação
assimétrica nos dá um novo motivo para sermos temerosos em relação ao
mercado".
Por outro
lado, há pouco mais do que um parágrafo, e bastante sucinto, sobre a possibilidade
de falhas do governo. E é fato que a intervenção
estatal no mercado sempre torna
as coisas piores. É um caso típico de
a cura ser pior do que a
doença.
Ademais,
não há qualquer explicação sobre quem irá regular os
reguladores.
James Buchana,
Gordon Tullock e outros nos ensinaram a analisar a
política sem romantismos, utilizando a lente econômica para observar como a
política pública funciona no mundo real.
Essa útil abordagem para futuros conselheiros de política econômica está
completamente ausente do livro-texto de Mankiw.
Conclusão
Mark Twain
certa vez disse: "O que lhe causa problemas não é aquilo que você não sabe, mas
sim aquilo que você jura saber, mas que está errado".
No caso
da economia, são ambas as coisas.
É lamentável
que milhões de estudantes de economia jamais sejam expostos à maneira correta de
pensar a economia ao longo de seus vários anos de educação formal.
Poucos estudantes
de economia aprenderão a diferenciar, dentre tudo aquilo que aprendem, o que é útil
e o que é contraproducente. Quando a
humildade em face do conhecimento restrito não é ensinada, há o risco de se
criar um grupo de pessoas espertas ávida para inadvertidamente criar um caos econômico
planejado.
Os estrategistas
de política econômica de hoje foram os estudantes de ontem. Aqueles que se imaginam capazes de prever o
futuro e de usar estatísticas agregadas para gerenciar e planejar a economia criam
o cenário para as lambanças econômicas que tanta desgraça causam aos países.
As idéias
dos economistas são mais poderosas do que se pode imaginar a princípio — e não
só por causa das idéias erradas que são ensinadas; ainda mais importante são as
idéias corretas que são omitidas por intelectuais influentes.