Sabe
por que devemos começar esse curso mostrando a importância das instituições na
economia? Imagine que o seu pai (ou,
mesmo, você) queira abrir uma loja para vender sapatos. Para isso, ele vai ter que obter autorização
do governo. Como a burocracia no Brasil
é enorme, o seu pai só vai conseguir essa autorização em cerca de cinco
meses! Agora, se você vivesse, por
exemplo, na Nova Zelândia, em menos de uma semana o seu pai já poderia abrir a
sapataria. Isso quer dizer que, no
Brasil, ele deixaria de vender sapatos e, portanto, de ganhar a receita das
vendas por 150 dias! E, ainda, supondo
que ele desejasse contratar dois vendedores para trabalharem na loja, que
durante aqueles cinco meses essas duas pessoas não teriam os seus empregos!
Entendeu
por que é tão importante analisar a economia tendo em vista as instituições de
uma sociedade? No Brasil, essas
instituições (no exemplo dado, a burocracia e a intromissão do governo na vida
das pessoas) desencorajam quem quer trabalhar para melhorar de vida. Em outros países, como a Nova Zelândia, as instituições
estimulam as pessoas que desejam progredir.
Vamos
a outro exemplo: você sabia que os brasileiros trabalham até o dia 25 de
maio de cada ano para pagar os tributos (impostos, taxas e contribuições)
que existem no Brasil? E que são
obrigados a pagar, senão serão punidos? O
estado argumenta que a receita dos tributos é para ser revertida em educação,
saúde, justiça, segurança e infraestrutura.
Agora responda com sinceridade: apesar de, como brasileiro, sermos
obrigados a trabalhar praticamente cinco meses do ano para o governo, nós temos
um sistema de educação bom? De saúde? Nossa justiça é boa? Vivemos com segurança? Nossas estradas e portos são bons? E ainda mais: será que esses cinco itens devem
ficar nas mãos do governo? Por quê? Então, para que trabalharmos cinco meses de
graça?
Um
terceiro exemplo: um empregado com um salário de mil reais por mês custa
mensalmente, na sapataria do primeiro exemplo, aproximadamente, dois mil e seiscentos reais por
mês, ou seja, mais do que o dobro do salário. Isso
acontece porque existem os chamados encargos sociais e trabalhistas, como a
contribuição sindical, o fundo de garantia do tempo de serviço, a contribuição previdenciária,
o 13º salário e várias outras exigências. O resultado disso é que, em vez de empregar
aqueles dois funcionários, o seu pai vai empregar apenas um na sua sapataria. Esses encargos provocam, portanto, desemprego
e, sendo assim, prejudicam enormemente a economia.
Quando
usamos a palavra "instituições", então, estamos querendo dizer que os atos
econômicos são influenciados por fatores políticos, éticos, morais, jurídicos,
psicológicos, históricos, sociológicos etc. Quando você encontra dificuldades, por
exemplo, para comprar um computador no exterior, é porque alguma decisão
política estabeleceu essa dificuldade; quando você se recusa a comprar um
aparelho celular que você sabe que foi roubado, é uma imposição ética, da sua
consciência, que impede você de fazer essa compra; quando você assina a
escritura de compra de um imóvel é porque existe uma legislação sobre o
assunto; quando você (se for o caso) sempre que comprar uma camisa, comprar
outra idêntica, porque acha que assim terá sorte, é uma decisão influenciada
por fatores psicológicos e assim por diante.
Por
isso, diversos estudiosos das sociedades costumam dividi-las, para efeito
didático, em três grandes sistemas, a saber, o sistema econômico, o sistema
político e o sistema ético-moral-cultural. O primeiro é formado pela economia, isto é,
por todas as transações econômicas, desde as mais simples até as mais
complexas; o segundo, pela política, ou seja, pelos partidos, pela forma de
governo, pela divisão de poderes,etc. E
o terceiro pelas regras morais e características culturais, que acabam se
refletindo nas leis.
Cada
um desses grandes sistemas vai mudando de forma particular ao longo do tempo e
possui regras de conduta, métodos, padrões e objetivos peculiares e, muitas
vezes, contrastantes. É desse contraste
que vem a energia para o progresso e para a correção das distorções que
eventualmente surgirem. Quando um ou
dois desses sistemas não estão funcionando bem, os restantes podem sustentar a
vida social durante algum tempo, mas quando os três apresentam problemas
graves, a sociedade fica instável.
É
fácil entender que, desses três sistemas, o ético-moral-cultural é o mais
importante, porque quando ele vai mal, é muito difícil que a economia e a
política possam funcionar adequadamente. Por exemplo, uma regra moral que deve
prevalecer em toda e qualquer sociedade que se preza é aquela que proíbe o
roubo e a corrupção. Se essa regra for
desobedecida de modo generalizado, é claro que o roubo e a corrupção vão
contaminar a economia e a política, e vai acabar acontecendo um caos na
sociedade.
Há
duas maneiras de se abordar as questões sociais. A primeira, que podemos chamar de construtivismo (ou engenharia social), baseia-se na ideia de que a mente e a razão
humanas são capazes, por si sós, de permitir aos homens construírem uma
"sociedade ideal". Um exemplo desse tipo
de visão é o socialismo-comunismo, como nos casos da antiga União Soviética, de
Cuba, da Coreia do Norte e do Vietnã do Norte (a China, de alguns anos para cá
vem abandonando lentamente esse modo de ver a sociedade). Outro exemplo de construtivismo é a Alemanha
da época de Hitler. Como você já deve
ter percebido, quem acredita que as pessoas podem construir uma sociedade ideal
tem que acreditar também que o poder para tomar as decisões julgadas como
"melhores" para todos deve ficar concentrado em poucas mãos. Não é por acaso que todos esses exemplos são
casos de ditaduras com forte concentração de poder, seja nas mãos de um partido
(o comunista ou nacional-socialista, que era o nome do partido nazista) ou,
mesmo, de uma só pessoa.
A
segunda maneira de enxergar as questões sociais pode ser chamada de racionalismo crítico: racionalismo porque
sabe que o homem é racional; mas crítico, porque também sabe que nossa mente e
inteligência são falíveis e que cometemos erros, mesmo quando somos bem
intencionados. Ora, se nós cometemos
equívocos (por exemplo, compramos um aparelho de TV de baixa qualidade), por que
devemos supor que as pessoas do governo também não erram? Se você pensar bem, será que os que trabalham
no governo não erram mais do que nós, porque nós tomamos decisões baseadas na
nossa satisfação, enquanto eles decidem o que é melhor ou pior para os outros? Quem disse que eles sabem o que é melhor para
você e sua família do que você mesmo e a sua família?
Além
de não sermos infalíveis em todas as decisões que tomamos, existe outro
condicionante para essas decisões, que é o nível de nosso conhecimento sobre
todos os fatores que influenciam as nossas decisões. O nosso conhecimento jamais é perfeito e, além
disso, ele vai mudando conforme o tempo vai passando. Por isso, uma decisão qualquer pode ser a
melhor possível às três horas da tarde, mas ser uma péssima decisão duas ou
três horas depois. Além disso, decidir
sobre algum ato econômico é sempre uma questão pessoal, muito diferente das
decisões de engenharia ou de química. Com
isso, queremos que você perceba que a economia, vista como ciência, é uma ciência
social, não exata, que não se sujeita a leis matemáticas, e não uma ciência
natural, mecânica e impessoal.
Outro
fato que mostra que o construtivismo é
um equívoco: a economia lida sempre com decisões de indivíduos, decisões pessoais, porque os seres humanos são
individualistas. Ora, o construtivismo
trata as pessoas como se fossem coletivos (e não indivíduos), como, por
exemplo, "a sociedade". Pense só nisto:
a sociedade existe, é claro, ela é a soma dos indivíduos que fazem parte dela,
mas quem toma as decisões econômicas (como, aliás, qualquer outra decisão) não
é ela, mas sim os indivíduos!
Nas
colmeias, cupinzeiros e formigueiros, cada abelha, cada cupim e cada formiga
não "pensam" em si, mas no coletivo. Tudo
o que fazem é em prol da colmeia, do cupinzeiro ou do formigueiro. Mas com os homens isso não acontecerá jamais,
porque tendemos primeiro a pensar em nós próprios e em nossas famílias, depois
nas pessoas mais próximas, depois no nosso bairro ou no nosso local de trabalho
e só vamos pensar na "sociedade" em último lugar. O socialismo, portanto, trata os seres humanos
como se fossem formigas, cupins ou abelhas, sem vontade própria e sem
individualidade e por isso é um sistema desumano. Agride as características básicas da espécie
humana. Sendo assim, fracassou redondamente nos países em que foi imposto e
fracassará sempre onde quer que venha a ser implantado.
A
experiência histórica, que a Escola Austríaca de Economia sustenta, mostra que
o principal ingrediente para que as economias alcancem o progresso é a liberdade de escolha. Como veremos na segunda aula, passamos a nossa
vida fazendo escolhas, desde o berço
(quando, por exemplo, escolhemos brincar com um carrinho azul e não com um
vermelho), passando pela escolha da profissão, de com quem nos vamos casar, da
escola para matricular nossos filhos etc. Sempre que as pessoas fazem uma escolha, seja
no campo da economia (como comprar uma caneta) ou nos outros (como em quem votar)
elas imaginam que, naquele momento em que a escolha é feita, aquela é a melhor
opção para aumentar a sua satisfação.
Quanto
maior a nossa liberdade de escolha, maior a possibilidade de ficarmos mais
satisfeitos, de outros ficarem satisfeitos e da economia como um todo
progredir. Quando as telecomunicações
estavam a cargo do estado, você só tinha uma empresa de telefonia operando na
sua cidade, tinha que esperar um tempo enorme para instalarem um telefone na
sua casa, se comprasse um celular tinha que registrá-lo em cartório, os preços
eram absurdamente altos e não adiantava você reclamar. Depois que o setor foi privatizado, nossa
liberdade de escolha aumentou bastante, o número de linhas fixas se
multiplicou, o número de celulares cresceu enormemente, a competição entre as
empresas aumentou e os preços dos serviços em termos reais diminuíram. Além disso tudo, com a entrada de novas
empresas no mercado, o número de empregos aumentou.
Procure
agora saber se as pessoas que vivem em Cuba têm acesso a telefones (fixos ou
celulares). Entendeu então o que queremos
dizer com a expressão liberdade de
escolha?
Por
fim, temos que falar da importância da propriedade
privada para o desenvolvimento individual: se você fosse um fazendeiro da
Sibéria no tempo do comunismo e uma das vacas (que eram de propriedade do governo)
estivesse para morrer de frio, dificilmente você deixaria a sua cama às duas
horas da manhã para salvá-la, porque a vaca não era sua, era do estado. Mas, se ela fosse sua, primeiro, você cuidaria
para que ela não sentisse frio, gastando em equipamentos de calefação e,
segundo, mesmo que ela viesse a sentir muito frio, você com certeza deixaria a
sua cama para salvá-la, sabe por quê? Simplesmente porque ela lhe pertencia!
A
propriedade privada, portanto, ao lado da liberdade de escolha e da economia de mercado são fundamentais
para que as pessoas progridam na vida e, portanto, as sociedades também se
desenvolvam cada vez mais. Explicaremos
a economia de mercado em uma das aulas seguintes. Por ora, registramos apenas que uma economia
de mercado é uma economia em que prevalece a liberdade de escolha individual,
seja para consumir como para produzir, para poupar, investir, etc. Em outras palavras, uma economia em que o
estado não exerça controles. Esses
controles, como veremos oportunamente, são sempre maléficos, ao contrário do
que, com certeza, ensinaram você a acreditar.
Estamos
agora, depois dessas observações sobre a importância das instituições,
preparados para as nove lições seguintes, em que vamos tentar mostrar como a
economia do mundo real funciona.
Como
o homem nasceu para ser livre, para viver uma liberdade responsável, as
melhores instituições para estimularem a melhoria do padrão de vida das pessoas
são a liberdade de escolha ou economia de mercado e a propriedade privada.
Sugestões de leitura:
Iorio,
Ubiratan J., Economia e Liberdade: a
Escola Austríaca e a Economia Brasileira, caps. 1 e 2, Forense Univ., 1997,
Rio de Janeiro, 2ª edição.
Fedako,
J, O "nós" é uma falácia
Mises,
L, A desigualdade e o egoísmo
estimulam o desenvolvimento
Bastiat,
A vidraça quebrada
Williams,
W, A pobreza é fácil de ser
explicada
Sugestões
para reflexão e debate:
1.
Pense se é mesmo tão importante que, para abrir uma sapataria, você tenha que
obter autorização do governo.
2.
Você acredita que uma só pessoa que detenha todo o poder político (por exemplo,
Fidel Castro em Cuba) pode determinar o que é melhor ou pior para você, de modo
melhor do que aquele que você mesmo decidir escolher?
3.
Por que a economia não é uma ciência exata?
4.
Por que a liberdade de escolha e a propriedade privada são tão importantes para
o desenvolvimento das economias?
5.
Pense na diferença entre uma economia baseada em indivíduos e uma economia
baseada em "coletivos".