segunda-feira, 5 set 2011
Os
mercados financeiros estão passando por mais uma fase de liquidação, com as
bolsas ao redor do mundo no vermelho. No
entanto, as noções tradicionais a respeito de quais investimentos caracterizam
um "refúgio seguro" em épocas de crise estão mudando. O dólar americano, ao que tudo indica, já
deixou de ser um refúgio contra calotes e incertezas. Esse papel foi assumido pelo ouro, pelo
franco suíço e pelo iene japonês — que agora são ativos preferidos de
investidores assustados.
Todos
esses três refúgios — ouro, francos suíços e ienes — se valorizaram em agosto. Dois deles, no entanto,
estão sendo diligentemente desvalorizados por seus respectivos bancos centrais,
os quais estão desesperadoramente (e muito tolamente) tentando restringir sua
apreciação. Os suíços e os japoneses
estão implementando todas as políticas fiscais e monetárias possíveis, bem como
toda a retórica que podem inventar, para conter o fluxo de investimentos
estrangeiros que está inundando seus respectivos países e, com isso, apreciando
suas moedas nacionais.
A
questão agora é saber qual será o último refúgio existente.
Suíça: da neutralidade ao intervencionismo
Analisando
a Europa, o britânico Financial Times tem agora a deselegante tarefa de
noticiar que a poderosa moeda da União Europeia está em processo de
desintegração, ao mesmo tempo em que a vizinha Suíça mal tem hotéis suficientes
para alojar todos os náufragos do mercado financeiro mundial que lá desembocam
em busca de refúgio. Apenas este ano, o
franco suíço valorizou-se 5,41% em relação ao euro e praticamente 14% em
relação ao dólar. É de se imaginar se a
única maneira de impedir um colapso destas duas moedas altamente endividadas é
lastreando-as a relógios de pulso suíços.
Isso pelo menos forneceria um padrão-ouro parcial, e não haveria
desculpas para se chegar atrasado a uma manifestação por medidas de
austeridade.
Infelizmente
para todos, o Banco Central da Suíça (chamado de Banco Nacional Suíço — BNS)
não parece disposto a fornecer este abrigo seguro. Ele está tão receoso dessa valorização do
franco suíço, que vem inundando o mercado com mais liquidez, além de ter
cortado a taxa básica de juros para zero.
O BNS recentemente chegou até a ameaçar atrelar o franco suíço ao euro,
fixando a taxa de câmbio e assim impedindo flutuações no valor da moeda. Tal medida seria como se os sobreviventes de
um dos botes salva-vidas do Titanic ficassem tão confusos e desnorteados, que
resolvessem amarrar seu bote ao navio naufragando — tudo pelo desejo de manter
uma "relação estável".
Aviso ao Japão: não são os especuladores
O
Japão tem sido ironicamente bem sucedido: embora seu endividamento seja severo,
ele tem estado severo há tanto tempo que os mercados financeiros começaram a
ver isso como um sinal de estabilidade.
E, fora esse problema da dívida pública, o Japão possui fundamentos
razoavelmente impressivos. O país ainda
apresenta uma economia produtiva, com altas taxas de poupança e com larga
exposição à China, cuja economia vem crescendo vigorosamente há décadas. Sendo assim, não é de se espantar que, só
este ano, o iene tenha se valorizado 6,63% contra o dólar até agora.
O
ex-ministro das finanças e agora primeiro-ministro, Yoshihiko Noda, anunciou
recentemente que tomaria "medidas drásticas e arrojadas se necessário, e não
descartaria nenhuma opção possível" para conter a apreciação do iene. Contudo, embora Noda tenha dito que sua gestão
irá estudar se a "especulação" está por trás da valorização do iene, ele não
parece entender que tal fenômeno representa na realidade uma definitiva mudança
de paradigma: as pessoas estão fugindo do dólar e do euro e indo para qualquer
coisa que aparente ser uma alternativa melhor.
Isso não é um fenômeno comandado e orquestrado por especuladores de Wall
Street, mas sim por investidores comuns à procura de abrigo e proteção.
As atitudes estão claramente mudando
Meus
leitores sabem que sempre considerei estes últimos anos da economia americana
como anos de crise contínua. A economia
do país não está vivenciando meramente aquilo que a imprensa passou a
classificar como sendo um duplo mergulho recessivo, intercalado por um período
de crescimento econômico. A realidade é
que o país está realmente no meio de uma prolongada depressão econômica. Os recorrentes pânicos nos mercados
financeiros que vêm ocorrendo desde 2007, tanto nos EUA quanto na Europa, são
todos causados pela mesma doença, e, como tal, devem ser entendidos como
sintomas relacionados, e não como eventos distintos.
E
como uma narrativa longa e tenebrosa, estes subsequentes pânicos se assemelham
a uma série de etapas — seguidas quedas acentuadas fazem com que cada nova
situação tenebrosa seja considerada uma "nova normalidade. Há duas tendências futuras: ou as pessoas vão
se acostumando a essa rotina lúgubre, ou — o que é mais provável — haverá um
colapso tanto do dólar quanto do euro, fazendo com que haja um retorno em massa
à utilização do ouro como moeda.
Meu
irmão, Andrew Schiff, escreveu um artigo para minha empresa de corretagem este
mês fazendo uma análise das recentes turbulências nos mercados financeiros e
comparando-as a todas as crises ocorridas desde 2007. Ele notou uma contínua mudança de percepção
quanto ao que os investidores consideram ser um porto seguro.
Durante
o período mais intenso do sufocamento
do crédito, de outubro de 2008 a março de 2009, o índice S&P perdeu mais de 25% de
seu valor, à medida que os investidores fugiram em manada para o dólar,
valorizando a moeda americana em 8%. As
bolsas de valores estrangeiras despencaram e a maioria das moedas estrangeiras
se desvalorizou substancialmente perante o dólar. O franco suíço caiu mais de 3%. O ouro subiu 6,5% e o iene, 5,75%, mas nenhum
manteve o ritmo do dólar, que chegou a subir 13,5%.
E
então, durante a nova queda ocorrida entre 23 de abril de 2010 e 2 de julho de
2010, a S&P perdeu quase 15%. O
dólar apreciou pouco mais que 3%. O
franco suíço, desta vez, apreciou-se ligeiramente, ao invés de se
desvalorizar. E tanto o iene quanto o
ouro ganharam do dólar, valorizando-se 4% e 5,5%, respectivamente.
E
eis que aqui estamos, no início de setembro, fazendo a mesma pergunta de
sempre: o que está acontecendo?
Em
agosto, sob intensa volatilidade, o S&P caiu mais de 13% e depois
recuperou-se, voltando ao mesmo nível de antes.
O dólar manteve-se essencialmente estável, mesmo com a intensificação
dos temores na zona do euro. O iene
também se manteve estável, não obstante as pesadas intervenções do Banco
Central japonês para desvalorizá-lo. O
franco suíço já havia se valorizado 8% antes de o Banco Central suíço ameaçar
atrelar a moeda ao euro. E, por fim, o
ouro valorizou-se quase 12%!
Percebeu
o padrão? A cada etapa dessa espiral
declinante plurianual, os investidores globais vêm lentamente, porém
consistentemente, alterando seus refúgios preferidos. Alternativas estão sendo desesperadamente
procuradas, embora as medidas tomadas primeiro pelo Banco Central japonês e,
mais recentemente, pelo suíço, tenham impedido que suas respectivas moedas
aumentassem seu potencial como alternativa ao dólar.
Felizmente,
o ouro não está sob o comando de um banco central, de modo que ele pode se
apreciar tão rapidamente quanto a desvalorização do dólar e de outras moedas.
O rebaixamento das moedas de papel
Seja
do interesse deles ou não — e eu argumento que não é —, os bancos centrais parecem
prontos para dar continuidade às políticas de desvalorização de suas moedas
(isto é, impressão de dinheiro) com o intuito de estimular exportações e
impedir recessões. Caso contrário, suas
economias teriam de enfrentar as dificuldades exigidas pelo processo de
correção da estrutura de produção da economia (recessão) — algo
desesperadoramente exigido pela realidade econômica mundial.
É
por isso que o ouro está se saindo fenomenalmente bem, e é por isso que ele
deve continuar assim. A mineração de
ouro — isto é, o aumento do estoque de ouro no mercado — ocorre a uma taxa de
aproximadamente 2% ao ano. Esse número
tem se mantido razoavelmente constante ao longo do tempo, e reflete a
capacidade das mineradoras de localizar, obter financiamento, comprar e
desenvolver novas minas. Eu invisto
nestas empresas de mineração e, creia-me, não é um trabalho fácil.
Compare
isso ao dinheiro fiduciário de curso forçado, que pode ter sua quantidade
aumentada com uma simples batida de tecla no computador. Da mesma forma, basta acrescentar um zero às
cédulas para que mais dinheiro esteja em circulação. Está vendo essa nota de
$10? Shazam!, agora ela vale $100.
O
motivo de moedas como o iene
e o franco suíço serem consideradas seguras decorre simplesmente do fato de que
seus respectivos bancos centrais sempre tiveram o hábito de não imprimir
dinheiro em
demasia. Porém, um
hábito é muito menos confiável do que uma restrição física.
Pense
em um cachorro que foi treinado para não comer carne. Se você o deixar em um quarto com um
suculento pedaço de costela, em qual situação você teria mais certeza de que
encontraria a costela intocada: com o cachorro amarrado a uma coleira presa a
um poste ou com o cachorro totalmente livre para circular? Assim como um cachorro sempre irá desejar uma
posta de carne, e irá morder um pedaço quando ninguém estiver olhando, bancos
centrais também sempre anseiam por utilizar a impressora.
É
por isso que, para proteger toda a nossa poupança, devemos recorrer um ativo
cuja escassez é ditada única e totalmente pela natureza — o ouro.
À
medida que essa constatação for se tornando mais corriqueira, e à medida que a
depressão mundial for se intensificando, meu palpite é que o ouro se tornará o
último refúgio existente. E isso não
será uma "nova normalidade", mas sim um retorno a milhares de anos de tradição
econômica.
Uma observação sobre fundamentos
Aqueles
que realmente não entendem de fundamentos econômicos seguem afirmando que o
ouro está em uma bolha. O famoso corretor
e investidor de commodities, Dennis
Gartman, recentemente afirmou, mais uma vez, que o ouro já chegou à sua
cotação máxima, declarando que uma das "maiores bolhas de nossa época"
finalmente estourou.
Ele
cita como evidência a rápida valorização de 200 dólares ocorrida em agosto, o
que levou o ouro para mais de US$ 1.900 a onça — algo que Gartman vê como
evidência de uma bolha em seu último estágio de inflação, após o qual viria uma
súbita e abrupta queda. Ele também cita
como evidência o insignificante fato de que um ETF de ouro, GLD,
possui maior valor de mercado do que um ETF da S&P 500. Ele absurdamente compara essa situação ao que
ocorreu durante a bolha imobiliária japonesa, quando o palácio do imperador
japonês passou a valer
mais do que todos os imóveis do estado da Califórnia.
O
fato é que esses ETFs representam simplesmente uma dentre várias formas de
manter ativos, e não indicam, como afirma Gartman, que os investidores estão
valorizando o ouro mais do que todo o mercado de ações americano. A verdade, aliás, é que uma real comparação
entre as duas classes de ativos revela que o valor do ouro está historicamente
baixo em relação ao valor das ações americanas.
Ao
invés de significar o estouro de uma bolha, os recentes acontecimentos no
mercado do ouro estão mais para uma indicação de que haverá uma grande subida
nos preços. Durante essa recente
correção havida nos preços do ouro, a divergência positiva entre as ações de
ouro e o preço dos lingotes representou na verdade uma evidência de que está
começando um novo período de ascensão no preço do ouro. Até agora, o mercado de ações de ouro tem
sido caracterizado pelo receio.
Entretanto, ao que tudo indica, agora me parece que as ações de ouro
subirão mais do que o próprio metal.
Caso as ações finalmente comecem a subir mais do que o metal, isso
significa que os investidores finalmente estão começando a acreditar que a
valorização do ouro é duradoura. Ao
invés de evidenciar o fim de uma tendência, essa mudança de atitude muito
provavelmente indica uma aceleração dessa tendência. Talvez quando o último cético finalmente
jogar a toalha e entrar nessa corrida, poderemos finalmente ver a bolha
chegando ao seu último estágio de inflação, algo que Gartman crê já ter
ocorrido. Mas esse dia está muito longe
do presente.
A
verdade é que toda essa conversa de que o ouro está em uma bolha parece se
basear no fato de que muitos investidores começaram finalmente a falar sobre
ouro. O problema é que, não obstante
toda a conversa, o fato é que são muito poucos os investidores que realmente
estão comprando ouro. Bolhas não são
formadas por conversas, mas sim por ações concretas. Para termos uma bolha no mercado de ouro,
todos esses investidores que estão apenas falando sobre ouro têm antes de começar
a comprar uma onça de ouro. Com efeito,
para que uma bolha se forme e estoure, não apenas os investidores, mas também o
cidadão comum terá de estar comprando ouro maciçamente. Porém, até agora, ele nem sequer entrou na
conversa.