A Comissão Europeia obrigou a Apple a devolver ao
governo irlandês 13
bilhões de euros.
Motivo: a Irlanda teria violado as regras da União Europeia
ao implantar alíquotas de impostos baixas
demais. Para a UE, conceder alíquotas
de impostos baixas demais representa uma vantagem fiscal "ilegal".
Mas a coisa é ainda mais surreal: o próprio governo
irlandês já avisou que não
quer o dinheiro. Ainda em 1980, o
governo irlandês havia prometido
essas alíquotas baixas para incentivar a Apple a se instalar e a permanecer
no país, levando ao então pobre país empregos e crescimento econômico, à época
desesperadoramente necessários (a Irlanda era um dos países mais pobres da Europa).
O governo irlandês sabe que, se quebrarem esse
contrato com a Apple, não apenas o país corre o risco de ficar sem a empresa,
como também outras empresas podem desistir de se mudar para lá. Pior: podem sair de lá.
Vale deixar bem claro o seguinte ponto: o argumento
da Comissão Europeia é que a presumível vítima deste caso é apenas o fisco irlandês,
e não o erário dos outros governos europeus.
Oficialmente, a Comissão não está
condenando a Irlanda por praticar dumping
fiscal por meio de sua baixíssima alíquota de Imposto de Renda de Pessoa
Jurídica (meros
12,50%, um dos menores do mundo), beneficiando a Apple à custa do erário do
resto dos estados-membros. E ela não está
fazendo isso porque, em essência, a Comissão não tem a competência para emitir
éditos acerca da política fiscal de um estado-membro. A Comissão está condenando a Apple por ter
deixado de pagar impostos na Irlanda, e não no resto da Europa.
Por isso, não deixa de ser curioso que a suposta
vítima do caso -- o governo irlandês -- tenha se manifestado veementemente
contra a resolução de Bruxelas, chegando ao ponto de anunciar que recorrerá
aos tribunais europeus para reverter a decisão. Deve ser um caso único na história de um
governo se recusando veementemente a receber mais dinheiro de impostos.
Segundo o Ministério
da Fazenda irlandês, a Apple já pagou todos os impostos que tinha de pagar
de acordo com a legislação tributária do país, de modo que a Comissão Européia estaria
atacando diretamente a soberania fiscal de um estado-membro.
Por que, então, a Comissão resolveu entrar de sola
neste quesito? Segundo a versão oficial,
porque o regime fiscal usufruído pela Apple na Irlanda poderia estar afetando a
concorrência entre empresas européias -- a Apple recebe "privilégios" que as
outras empresas não recebem --, e a Comissão pode sim se pronunciar em matéria
de concorrência intracomunitária.
A realidade, no entanto, é outra: Bruxelas está
utilizando suas atribuições em matéria de concorrência para se arrogar competências
tributárias (que ela legalmente não possui) com o propósito único de cartelizar
os estados-membros em sua cruzada para converter a União Européia em um inferno
fiscal sem fissuras internas.
A UE foi criada com o objetivo de "harmonizar" os impostos e
as regulamentações econômicas entre os países. O centro do Império (Bruxelas) deve governar
toda a periferia, impondo e executando essa harmonização. Se uma determinada
alíquota de imposto estiver variando dentro União Européia, a intenção é "harmonizá-la"
na alíquota mais alta para todos os países.
Por que a Comissão disse que a Apple recebe um
tratamento fiscal privilegiado? Porque a
Comissão não gosta do regime fiscal da Irlanda, o qual, pelos seus baixos
impostos, "concorre deslealmente" com as demais social-democracias européias,
colocando em risco a sustentabilidade desse sistema. E se todas as empresas se mudarem para
Irlanda? Como os outros países europeus irão
continuar bancando seus onerosos estados de bem-estar social?
O atual CEO da Apple, Tim Cook, resumiu a situação com perfeita
lucidez: "Utilizando o critério da Comissão Europeia, qualquer empresa na Irlanda
e na Europa pode repentinamente se descobrir sujeita a novos impostos em
virtude de leis que jamais existiram".
Para o super-estado europeu, um parasitismo mais prudente
e sustentável -- como o feito pelo governo irlandês -- não é uma opção. O governo celta deve espoliar com mais
intensidade seus hospedeiros, caso contrário as outras vorazes social-democracias
do continente terão uma "concorrência desleal".
Este sistema tributário irlandês que a Comissão quer
aniquilar representa uma das características mais distintivas e marcantes do
país celta: uma vantagem competitiva que permitiu à Irlanda, em apenas 35 anos,
deixar de ser um dos países mais pobres da atual zona do euro e se tornar o segundo
mais rico, atrás apenas de Luxemburgo.

Os
britânicos estavam certos
Tudo isso mostra que os britânicos foram sábios em optar por
sair da União Europeia e que seria sensato que a Irlanda, ou qualquer outro
país, fizesse o mesmo. A União Europeia
é um impedimento à liberalização
econômica.
Dentro do super-estado europeu, nenhum país pode
escapar das onerosas leis e regulamentações impostas de cima para baixo pela
burocracia da União Europeia. Já com uma
descentralização política, indivíduos e empresas podem "votar com seus pés" e
se mudar para regimes menos onerosos. Sob
essa ameaça de "êxodo", os governos são obrigados a liberalizar a economia para
reter seus pagadores de impostos.
O governo irlandês pretendeu conceder mais liberdade
econômica para uma das mais inovadoras e adoradas empresas do mundo,
estimulando a Apple a "votar com seus pés" e se estabelecer no país. Bruxelas não podia tolerar isso. Se a Irlanda continuasse impune, outros
países poderiam se sentir impelidos a oferecer promessas tributárias similares
a empresas de tecnologia e, com isso, tornar suas próprias indústrias deste
setor competitivas. Tal competição poderia
se difundir e se espalhar para todas as alíquotas do IRPJ em geral. Para manter os impostos altos e,
consequentemente, os burocratas europeus bem remunerados, tal concorrência tem
de ser aniquilada na raiz.
Acima de tudo, a União Europeia é um cartel
tributário compulsório.
Por isso, os eurocratas não podem demonstrar
surpresa com o crescente euroceticismo que vem se manifestando desde o "Brexit",
o qual pode culminar em um "Irexit"
("Ireland" e "exit"). A União Europeia é
hoje um fator pauperizador, e não um catalisador da prosperidade.
Após desferir um golpe de estado fiscal contra a
Irlanda, a Comissão recebeu os aplausos irresponsáveis do resto dos europeus,
sadicamente contentes com este ilegítimo achaque de 13 bilhões de euros a uma
das empresas que mais revolucionou nossas vidas nas últimas décadas. Mas o caso da Apple não será o último: resoluções
similares estão sendo preparadas contra Starbucks, Google, McDonald's, Fiat
e Amazon. Os burocratas não irão sossegar
enquanto não estrangularem a concorrência tributária entre os países e
converter o Continente em um parasítico inferno tributário onde prosperam as
burocracias estatais.
Muito além da harmonização fiscal, o objetivo é a
rapina fiscal por meio da harmonização infernal. A Apple foi apenas a primeira vítima de um megalomaníaco
projeto europeu oposto a todos os ideais de liberdade e prosperidade que uma
vez já definiram a Europa.
Conclusão
Em seu passado, a Irlanda conquistou sua independência
de um governo estrangeiro predatório e empobrecedor. Que ela o faça novamente. O "Irexit" pode ser a próxima peça do dominó
que levará à completa dissolução da União Europeia.
A inventividade e o empreendedorismo dos
trabalhadores da Apple foram responsáveis por fascinantes contribuições e
melhorias em nossas vidas. Ajudar
a dissolver a União Europeia pode acabar sendo sua façanha suprema.
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