Há
certos ruídos que tendem a deixar as pessoas malucas e desorientadas. Pense em unhas arranhando um
quadro-negro. Ou em uma criança gritando
ininterruptamente durante um longo voo.
Ou em um assobio agudo e lancinante que simplesmente não acaba.
Agora
já podemos acrescentar a essa lista mais um ruído irritante: um presidente
americano que julga poder legislar salários mais altos e transformar isso em lei.
Para qualquer pessoa que saiba o básico de economia --
e cuja mentalidade não foi distorcida pela tentação do planejamento central --,
ouvir algo assim é como uma tortura. É
doloroso. Tal sandice vai deixando você
crescentemente insano, até que chega um momento em que você finalmente quer
gritar "Por favor, pare com isso! Eu suplico!"
Foi
assim que me senti quando Obama, naquele tom pomposo típico de políticos que se
julgam grandiosos, disse o seguinte em seu discurso anual sobre o Estado da
União:
Proclamemos que, na nação mais rica do planeta, ninguém que
trabalhe em tempo integral tenha de viver na pobreza, e elevemos o salário
mínimo federal para US$9,00 a hora. Esta
simples e única medida aumentaria as rendas de milhões de famílias
trabalhadoras.
Mas
por que parar por aí? Por que tamanha
parcimônia? Vamos declarar de uma vez
que todo mundo tem o direito de ganhar US$9.000 ou US$9 milhões por hora. Se o único obstáculo que existe entre nós e a
riqueza total pode ser removido pela palavra de um presidente e por uma medida
do Congresso, então sejamos felizes! A
vida é fácil!
Será
que Obama realmente não entende o que há de errado nesta sua abordagem? Eu sempre discordei dele, mas nunca realmente
imaginei que ele fosse um ignaro. Mas
desde suas primeiras entrevistas já estava manifesto que ele de fato parece ter
um ouvido seletivo para tópicos sobre economia.
Ele parece não entender sobre como a riqueza é realmente produzida. Ele parece achar que riqueza é algo que poder
ser criada via decretos políticos. Ele
também parece não entender como o sistema de preços funciona. E agora já podemos ter a certeza de que, se
ele entende como os salários funcionam, ele não está disposto a deixar que eles
funcionem.
É
claro que ele também poderia estar apenas mentindo. Não seria a primeira vez que um político faz
isso.
Grande
parte do atual problema com o desemprego juvenil nos EUA advém dos substanciais
aumentos ocorridos no salário mínimo nos últimos cinco anos. Quando a crise estourou em 2008, o salário
mínimo era de US$5,85. Vários empregos
foram abalados. Trabalhadores pouco
produtivos em empregos que pagavam baixos salários foram demitidos. Quando as coisas pareciam estar se acalmando,
o governo chegou chutando as portas. No
ano seguinte, eles decretaram que era ilegal aceitar um salário menor do que US$7,25
a hora. E ainda há gente estranhando que o desemprego tenha chegada aos dois dígitos?
Não há mistério algum nisso.
Empregos que pagam salário mínimo normalmente empregam pessoas pouco
produtivas. Se você aumenta forçosamente
o salário de pessoas pouco produtivas, passa a ser custoso empregá-las. No limite, você simplesmente não obterá
retorno nenhum com a sua mão-de-obra empregada.
Passa a ser irracional manter um empregado nestas condições. O acentuado aumento no piso salarial não
explica tudo, é claro, mas é um fator contribuinte que não pode ser
negligenciado.
Em
termos metafóricos, estabelecer qualquer tipo de piso salarial faz com que
várias pessoas fiquem presas no porão.
Quanto mais alto o piso, maior será o porão. Atualmente, milhões de pessoas estão presas
no porão, assustadas e sem saber como sair dele. E agora, para piorar as coisas, o presidente
americano, julgando estar 'criando empregos', quer fazer com que mais
desempregados se tornam permanentemente desempregados.
A
questão do salário mínimo é uma que me abala de maneira muito peculiar, e não é
por causa de algum livro de economia que já li.
Trata-se de um assunto cujas consequências vivenciei de maneira muito
intensa.
O
primeiro emprego real que tive foi em uma loja de departamentos. Eu fazia os serviços de manutenção. Eu tinha 15 anos (sim, eu menti a minha idade
para conseguir o emprego; naquela época, você podia fazer isso; o governo ainda
não nos amava tanto a ponto de nos impedir de trabalhar). Meu trabalho era limpar as latrinas, amassar
as caixas de sapatos e roupas, recolher alfinetes e broches dos provadores, encerar
o piso da seção de louças, aspirar todo o recinto, e limpar os vidros.
Era
um trabalho fantástico. Para mim, era
realmente grandioso. E eu adorava esta
minha função porque a considerava extremamente importante. Afinal, se eu não limpasse bem os banheiros e
não repusesse as toalhas e o papel higiênico, os clientes do dia seguinte
poderiam se sentir enojados e nunca mais voltariam ali. Desta forma, eu tinha um papel crucial em
garantir a lucratividade daquela loja.
Em
especial, eu adorava o meu colega de trabalho.
Seu nome era Tad. Quando a loja
de departamentos fechava ao final do dia e ficávamos apenas nós dós ali para
efetuar todo aquele trabalho magnífico, nossa diversão era enorme. Tudo era sensacional. A gente cantava alto enquanto trabalhava, vibrava
com os perigos da enceradeira, ficava enojado com o estado sórdido dos banheiros,
se divertia com as coisas mais simples possíveis -- em suma, a gente
simplesmente desfrutava aquela fantástica sensação de ter um real colega de
trabalho.
Veja
bem: Tad não era um garoto normal. Ele
possuía algumas deformidades físicas.
Seu rosto tinha um formato bastante esquisito e metade dele era coberto
por uma enorme mancha, a qual eu jamais pude identificar o que era. Ele também tinha dificuldades de locomoção. Além de ajudá-lo a se locomover de um lado
para o outro, eu tinha de selecionar cuidadosamente as tarefas que podia
atribuir a ele. Ele também sofria de
retardo mental. Ele falava de uma forma
bem abafada e difícil de ser entendida, o que me obrigava ser extremamente
claro em minhas instruções.
Mas
uma coisa eu posso dizer: quando ele ficava feliz, eu ficava feliz. Ver aquele enorme sorriso surgir em seu rosto
quando eu elogiava a maneira como ele havia encerado um balcão ou um guichê era
algo que elevava enormemente meu estado de espírito.
Um
belo dia, um cartaz foi afixado na nossa sala de trabalho. Era do Ministério do Trabalho. O salário mínimo seria elevado em 50
cents. Tad me apontou aquilo e disse,
"Olha, vamos ter um aumento!". Fiquei
desconfiado. Eu tinha a certeza de que
era o patrão quem determinava o salário, e não uma esquisita e distante
burocracia estatal. Não acreditei muito
que aquilo fosse verdade. Ainda assim, fiquei feliz por vê-lo
feliz.
No
dia seguinte, cheguei ao trabalho no horário de sempre, logo após a
escola. Preparei o esfregão e enchi o
balde com água quente enquanto me concentrava para o início de mais uma
jornada. Mas Tad não estava lá. Perguntei para o meu patrão, "Tad ainda não
chegou?"
E
aí ele me explicou que havia contratado Tad apenas porque ele era um garoto que
conhecera na igreja e que precisava de um emprego. Meu patrão sabia que Tad iria requisitar
muita ajuda, e este era um dos motivos de ele ter se entusiasmado tanto por eu
ter podido trabalhar com Tad. No final,
disse meu patrão, era tudo uma questão de caridade, pois ele sabia que eu
poderia realizar todo aquele trabalho sozinho.
Empregar nós dois era algo que ele podia se dar ao luxo de bancar apenas
a um determinado custo. Mas o novo
salário mínimo alterou as coisas. A
margem de lucro da loja era muito pequena, e ele foi obrigado a tomar essa
difícil decisão.
Em
suma: Tad havia sido dispensado.
Fiquei
devastado. Olhei novamente para aquele
cartaz do Ministério do Trabalho.
Maldita coisa! Aquele cartaz
havia arruinado a vida de um garoto.
Havia também interrompido um grande ato de caridade. E olha o que fez comigo. Agora eu tinha de trabalhar sozinho.
A
gerência saiu, as luzes foram diminuídas e eu ouvi aquele familiar estalido das
portas externas sendo fechadas. Teria de
fazer o serviço solitariamente naquela noite.
Fiz todas as tarefas que tinha de fazer.
Mas não havia músicas. Não havia
risadas. Não havia inocentes
palhaçadas. Não havia belos e
edificantes sorrisos. Tad estava em
algum outro lugar naquela noite, provavelmente em casa, confuso e triste.
Alguns
anos depois, ele morreu.
É
isso que a lei de salário mínimo significa para mim. Sim, você pode dizer que sou movido por um
espírito de vingança. Quando um político
anuncia que irá elevar o salário mínimo para melhorar a vida de todos, não
consigo deixar de imaginar os milhões de Tads que perderão aquela oportunidade
de fazer coisas maravilhosas neste mundo e com suas vidas.
Veja
também: Salário mínimo, estupidez
máxima